quarta-feira, 26 de julho de 2023

IREMOS DESSA VEZ, INICIAR A INVESTIGAÇÃO DA MENTE-CONSCIÊNCIA ENQUANTO PARTICIPANTES E NÃO COMO MEROS OBSERVADORES?


 

B. Alan Wallace em seu livro: Mente em equilíbrio diz que: “No início do século XX, nem os psicólogos acadêmicos nem os psicanalistas tinham conseguido elaborar métodos rigorosos de observar diretamente os processos mentais. Assim, após não mais de trinta anos, a introspecção foi em grande parte abandonada como meio de investigar de forma científica a mente. Houve duas razões principais para isso. Uma delas era que pesquisadores, trabalhando em laboratórios diferentes, tinham muita dificuldade em reproduzir as descobertas uns dos outros, pois os pacientes que praticavam a introspecção tendiam a “perceber” o que os pesquisadores esperavam que experimentassem. Não esqueçamos que também os psicólogos não conseguiam um progresso significativo no refino de sua própria introspecção e não a praticavam muito, pelo menos no exercício de sua condição profissional. Sem dúvida faziam seus pacientes experimentais examinar as próprias mentes, mas sem um treinamento sólido, rigoroso, que os capacitasse a fazer observações precisas, confiáveis. Assim, embora os cientistas usassem explicitamente a introspecção em suas pesquisas, deixavam-na nas mãos de amadores. A introspecção nunca se desenvolveu além do nível de uma “psicologia folclórica”.

Compreendendo melhor as causas supracitadas para que a introspecção não fosse adiante enquanto metodologia investigativa da mente humana, é bastante evidente que não tenha sido, quando pensamos no fato dos pesquisadores não serem praticantes do próprio objeto de sua investigação a “introspecção”. Quando nosso objeto de pesquisa é um elemento externo a nós, como por exemplo, investigarmos o funcionamento de uma determinada bactéria, de um modo geral e mecânico, não temos o porque olhar para algo subjetivo que diz respeito a nós, para aferirmos a realidade dessa bactéria, porém, quando objeto de nossa pesquisa ao invés da bactéria, passa a ser a própria experiência da consciência humana, como os pensamentos, as imagens mentais, os sentimentos, memórias entre outros fenômenos internos que coabitam em nós, é óbvio que não estamos diante de uma mesma situação! Porém, quando os pesquisadores tratam fenômenos externos com a mesma lógica que tratam os fenômenos internos, é evidente que alguma coisa não daria certa nessa lógica de investigação metodológica, pois se trata aqui de mundos ou naturezas distintas, por mais que encontremos correlações entre esses, as questões e fenomenologias humanas (fenomenológico aqui, me refiro aos pensamentos, a imaginação, aos sentimentos, a mente como um todo) são completamente distintas quando se comparado a estudar aquilo que está fora de nós como um simples observador do seu objeto observado.

Estudar a natureza da mente é romper com essa bolha de proteção do observador que vê de fora o seu objeto de pesquisa (mesmo que este, seja a mente, quando a estudamos pelo viés natural), estudar a natureza da mente é além de um observador que vê o seu objeto de estudo é tornar-se um participante com o próprio objeto. O físico John Archibald Wheeler especulou que o papel do observador é crucial para as leis da física, pois uma determinação das leis da física, sustenta ele, deve incluir uma compreensão do papel do observador. Anton Zeilinger, físico experimental nos fundamentos da mecânica quântica diz que: “A parte essencial do ponto de vista do professor Wheeler é sua verificação de que as implicações da mecânica quântica são tão extensas que requerem uma abordagem completamente inusitada de nossa visão da realidade e da maneira como vemos nosso papel no universo”. Alan Wallace diz que: “Uma grande pedra no caminho na consideração do papel dinâmico dos fenômenos mentais nas interações mente-cérebro é a insistência cartesiana de fornecer explicações mecânicas para todos os tipos de influência causal. Ninguém sabe como processos cerebrais objetivos geram ou influenciam a experiência subjetiva, ou como os fenômenos mentais influenciam o cérebro e o comportamento. Para contrabalançar a presente insistência cartesiana em explicações mecânicas para as interações mente-corpo, o estudo científico da mente precisa de uma saudável dose de empirismo baconiano (chegar ao real através do vivenciado) para examinar as aparências de tais interações com tão poucas ideias preconcebidas quanto for possível”. Nesse sentido, a introspecção entraria aqui como uma ferramenta angular para essa dose de empirismo baconiano como citado por Wallace. O Físico russo Andrei Linde, segundo Alan Wallace em seu livro: “Dimensões Escondidas – A unificação de física e consciência” o físico russo sugere que os cientistas ocasionalmente permitam-se superar o seu conservadorismo natural a respeito de teorias que parecem “metafísicas” e corram o risco de abandonar algumas de suas suposições-padrão. Uma delas é que a consciência, assim como o espaço-tempo antes da teoria da relatividade geral, desempenha papel secundário, subserviente, no universo, como nada mais que uma função da matéria. Essa visão científica da natureza como matéria que obedece a leis da física alcançou tamanho sucesso que logo esquecemos que tudo o que sabemos do mundo objetivo é conquistado por meio da consciência humana. O mundo objetivo da matéria torna-se a única realidade, assumindo um papel de ídolo (ídolo é um conceito usado por Francis Bacon aonde ele diz que: “o ídolo é o parceiro não afetado na conjugação entre dois fenômenos”, no caso aqui, quando entendemos que o mundo da matéria não é afetado pela consciência, a matéria nesse caso, passa a exercer o papel de ídolo, pois como sabemos, para as ciências naturais, a mente-consciência não interfere na matéria, mas o contrário sim) em suas interações causais com estados de consciência subjetivos.

A consciência não material e o sujeito-participante em uma pesquisa, mesmo sendo variáveis possíveis, estas foram colocadas de fora das práticas epistémicas naturais, é como se nesses 400 anos de revolução científica, ao materializarmos toda a experiência da vida em objetos materiais, fosse impossível suportar a ideia de algo que não fosse da natureza da matéria, nesse sentido, matamos todas as nossas experiências interiores e subjetivas de consciência-mente, restringindo-as a tudo aquilo que podemos explicar enquanto um espectro fenomênicos possível ao mundo manifesto-material, como algo sem importância ou irreal caso não enquadrasse nesse espectro do visível, do mensurável, do quantificável. Em outras palavras, quaisquer fenômenos da mente que não poderem ser medidos de nenhuma forma material pelas ciências naturais, serão condenados a inexistência, nesse caso, é o mesmo que pensarmos que talvez se compreendermos que a consciência-mente for algo de uma ordem da natureza inerentemente não material, chegaremos a conclusão que talvez ainda não iniciamos a investigação da própria.

A título de esclarecimento, não estamos querendo dizer que a ciência não deva investigar a meditação a luz das ciências naturais, encontrando aspectos objetivos (físicos) da influência da prática meditativa como desencadeadoras de processos fisiológicos e neurais, pois sabemos que a neurociência contemplativa como nas pesquisas do Dr. Richard J. Davidson e colaboradores, vem evidenciando o quanto determinadas práticas meditativas são capaz de promover mudanças funcionais e estruturais em nosso cérebro como no caso aonde se constatou que em grupos de praticantes veteranos (mais de 10 mil horas de prática ao longo da vida), percebeu-se que o uso de alguns tipos de práticas meditativas que estimulavam a atenção concentrada, isso fazia com que a amígdala ficasse menos ativa enquanto regiões do córtex pré-frontal por outro lado, eram mais estimuladas por essas práticas, isso gerou como uma das consequência, a constatação da diminuição na produção de cortisol em situações de stress, evidenciado que determinadas práticas meditativas, tem capacidade sim, de treinar um cérebro para que esse tenha mais resiliência diante de eventos que lhe causam stress.

 Constatarmos fatos científicos como esses aonde a prática de determinadas técnicas de meditação, consigam inibir parcialmente a amígdala enquanto em contrapartida gera-se a ativação de redes neurais que ligam o córtex pré-frontal à amigdala em praticantes veteranos de meditação se comparados a não praticantes, além destes dado serem significativos para as neurociências que investigam os benefícios da meditação, essas dados são encorajadores e muito positivos se pensarmos para além do ponto de vista científico, mas também do ponto de vista clínico-terapêutico e das implicações práticas através de programas educacionais e sociais com a meditação, para que essas práticas possam ser ensinadas como parte de um treinamento voltado para o ser humano no que diz respeito ao desenvolvimento de uma mente mais saudável e em paz consigo mesma, embora não sejamos simplistas quanto ao tema do “bem estar social”, pois um estado de bem estar, não se restringe apenas a uma única variável isolada, precisamos pensar no bem-estar como uma relação interdependente entre as dimensões biopsicossociais-espirituais que compõem o sujeito como um todo. No caso da meditação em específico, entendo-a como uma grande ferramenta a interferir em curto e longo prazo em todos esses níveis, desde se pensarmos no praticante que colhe os frutos da sua prática a nível pessoal, até quando a sua prática se relacione positivamente fazendo com que os frutos dessa se repercutam em suas ações cotidianas, afinal, o mundo em que vivemos tem como resultante manifesta, aquilo que cada um de nós imprime nesse mundo não é mesmo?

Porém, não é esse o debate que está sendo colocado aqui, pois nessa via, continuamos no mesmo paradigma cartesiano de medir, de fazer mensurações dos objetos da realidade que podemos enxergar através dos nossos sentidos e instrumentos de medição. A discussão que quero trazer está ligada ao fato, que a introspecção quando investigada externamente por cientistas que não realizam a investigação da introspecção em si mesmos, é como jogar um animal que não tem asas de uma montanha e desejar que ele voe, isso não funcionará! O mesmo se dá quando um cientista ao analisar os fenômenos vivenciados nas práticas introspectivas de alguém, após a pessoa analisada relatar suas experiências introspectivas, é de se esperar que aquilo que não fosse congruente com o repertório fenomenológico (subjetivo-interno) do pesquisador tende a se tornar estranho ou excluído ao campo investigativo desse, pelo fato de não ser o seu repertório interno de experiências, nesse sentido, o pesquisador não compreende o que as pessoas analisadas estão experimentando em seu laboratório de práticas. Se a metodologia em introspecção é conduzida assim, vemos que a claramente uma imaturidade ou não funcionalidade metodológica, pois como avaliar tendo como objetivo de minha investigação os fenômenos da consciência compreendendo que os fenômenos relativos a esse objeto são acessados e investigados pela via da introspecção sendo que eu (cientista) que quero pesquisá-los eu não me enveredo pela via que me conduz a tal experiência de contemplação do objeto?

Quando pensamos em uma abordagem metodológica que tem como alicerce epistémico as áreas humanas, existências, fenomenológicas que valorizem a vivência empírica, subjetivas ou mesmo simbólicas, como no caso da proposta por Francis Bacon “uma visão Baconiana ao invés da cartesiana”, como uma alternativa distinta ao modus operandi da investigação científica natural-cartesiana que adotamos e fomos educados a pensar e fazer ciência, compreendemos que temos outros caminhos para serem explorados. Como já supracitado, a investigação aos moldes das ciências naturais para investigar a meditação é de evidente relevância como as neurociências vêm demonstrando através de suas correlações entre os impactos positivos da prática meditativa em nosso cérebro, mas não podemos parar por aqui e continuarmos a aceitar essa como a única forma possível de investigação da meditação e dos fenômenos que envolvem essa pratica. A subserviência por parte da psicologia e da medicina aos moldes das ciências naturais como única alternativa possível, empalidecem o nosso amplo campo de possibilidades da investigação científica. O ato de se fazer ciência não deveria se limitar a uma única visão hegemônica, aonde as áreas humanas se subordinam às áreas biológicas e as áreas biológicas subordinam a física, sendo que a própria noção de matéria da qual a biologia hoje se subordina é restrita aos achados da física do século XIX que em nossos tempos já foram refutadas por noções mais amplas do entendimento do que se trata a matéria a partir da relatividade Einsteiniana e pelos próprios achados da mecânica quântica (aprofundo essa discussão no capítulo sobre as subordinações epistémicas dentro das ciências naturais). Ao meu entender, para acrescentarmos a introspecção como mais uma variável dentre as distintas formas epistémicas e metodológicas para se investigar a natureza da mente na ciência, essa, não deveria estar subordina as leis das ciências naturais e sim alicerçar-se em bases epistémicas que levem em consideração o empirismo vivenciado através das dimensões subjetivas e humanas dos sujeitos e a partir disso, construir um corpo teórico e de fundamentos para explicar a natureza da mente humana, assim como os Iogues fizeram através de suas práticas introspectivas e das literaturas que nasceram a partir dessas práticas que alicerçavam as suas próprias auto experimentações em seus laboratórios meditativos e não de uma teoria que antecedeu a própria experiência prática.

O cientista que pesquisa a introspecção sem promover sua própria introspecção é como um cego que nunca percorrera um determinado caminho e achar-se capacitado a ser guia de um outro cego (quando no caso do participante do experimento também não ser um praticante) pelo caminho não trilhado, e para piorar e gerar ainda mais confusão, se o cientista cego com respeito ao caminho, se aventurar a guiar um Iogue (participante do experimento que seja um praticante) que já enxerga o caminho e o conhece profundamente, mais confuso ainda se tornará essa pesquisa! Desenvolver uma investigação científica tendo como base epistémica a introspecção, só se tornará um método válido e funcional na medida que ambos os envolvidos: pesquisador e o grupo de praticantes testados forem ambos investigadores vivos de seus próprios laboratórios introspectivos. Quando isso acontece, começamos a estreitar um ambiente, um terreno, uma paisagem comum, aonde a compreensão fenomenológica e a construção de significados e até mesmo de uma linguagem própria possa ser construída por esses que estão frequentando esses “semelhantes” símbolos e experiências vivenciadas, assim como uma criança que aprende, entende e fala o idioma do qual está dentro do seu campo de experiências.

Na história supracitada aonde Nagalaskmi Devi conta sobre a amiga neurocientista que após ler os sutras de Patânjali, entende que para ela, esse se tratava do maior livro de ficção científica que já havia lido, penso que o contexto da cientista ter associado os sutras de Patânjali há um livro de ficção científica, sendo que para nós praticantes da meditação ele é claramente um livro de instruções e métodos práticos de técnicas meditativas, faz com que entendamos que um livro que parte de uma visão epistémica voltado para quem prática a introspecção, esse têm em si algum tipo de nexo do qual teremos elementos a serem investigados, assim como um músico que sabe ler partituras, por ter essa capacidade, passa a ter acesso ao estudo e análise das obras escritas de um compositor, porém, voltando a introspecção, para quem não a pratica, soa como algo muito estranho, e assim o é, pelo fato da cientista não ter aquele repertório de linguagem experiencial em sua própria experiência de vida, por isso ela achou o livro uma ficção, por mais interessante que fosse, assim acontece com os cientistas que querem pesquisar a introspecção mas não a praticam, é como se em determinado momento perdêssemos qualquer ponto referencial para compreendermos determinado assunto, como acontecem com as pessoas que ao ouvirem alguém falando em um idioma completamente desconhecido, não conseguem ter a menor ideia do que esteja sendo dito.

Apenas um adendo, quando me refiro aos cientistas que se enveredam em pesquisar a introspecção mas não a praticam, não me refiro aqui aos cientistas que têm como convicção científica, ideológica ou mesmo por uma questão de escolha e foco do seu trabalho, no qual optam pela visão epistémica das ciências naturais, como no casos dos que se debruçam na neurociência contemplativa, procurando relações causais entre as repercussões da pratica meditativa em nosso cérebro, me refiro aqui, a um “novo” corpo de cientistas que querem investigar a natureza da mente por vias não restritas as ciências naturais, mas que ao mesmo tempo, não se engajam em suas próprias práticas introspectivas, ou seja, não se tornam participantes-observadores, continuando restritos ao observador imparcial, distante do seu objeto de investigação. Como diria Pierre Weill em seu livro a Consciência Cósmica: “a diferença entre o cientista e o Iogue, é que o cientista observa o elétron, mas o Iogue se torna o próprio elétron”. O sentido de se tornar o próprio elétron aqui, é justamente se tornar o participante do próprio experimento. Para as pessoas com uma certa experiência acumulada e familiaridade com as práticas e terem tido a oportunidade de estarem na presença de mestres(as) vivos como no caso de raros Iogues que dominaram a arte da meditação e em consequência disso, atingiram grande compreensão sobre a natureza da mente e suas fenomenologias, portando esses uma condição desperta de mente completamente desconhecida para a maioria de nós e por nossas psicologias no ocidente, porém, que algumas tradições espirituais orientais vem investigando a milênios e vão chamar  essa condição desperta de mente de “Iluminação” ou um certo estado de estar consciente quanto a  “Natureza primordial da mente” (aprofundarei nesse tema em outro capítulo desse livro) é muito comum, quando esses Iogues comentam algo sobre suas práticas, percebermos que muitos praticantes conseguem alcançar, ou seja, compreender o que estão dizendo, pelo fato do que está sendo dito, ressoar com as suas próprias práticas meditativas, a qual encontrará um nexo casual com a fala do Iogue, quando esse fala de sua prática, a partir de um lugar sincero e honesto com relação as suas vivências empíricas, porém, é também muito comum que outras pessoas não consigam compreender nada do que está sendo dito, simplesmente por não ter acessado tal entendimento, pois aquele saber, naquele momento, ainda tornar-se maculado para pessoa, inacessível! porém, com o tempo, com a prática e a “alquimia” interna promovida por essa, tal entendimento passará também a ser acessível.  A linguagem de uma visão epistémica que parte da introspecção como forma de investigar a natureza da mente ou qualquer elemento da realidade que seja, têm como alicerce fundamental, o sujeito-participante que vivencia empiricamente o seu experimento aonde o observador e o objeto observado estabelecem um relação dialética entre si, sendo a introspecção o veículo que propiciará essa relação de complementaridade, por isso, quando se fala ou escreve a partir desse lugar interno que nasce de uma prática, esse só é acessível a quem o experimenta com a sua própria prática, do contrário, qualquer tentativa de entendimento por mais inteligente que pareça, é apenas um compreensão intelectual pálida sobre aquilo que não se vivencia. Essa posição pode parecer radical, mas não é, quando se trata de pensarmos que dentro desse tipo de metodologia para investigar a natureza da mente, a introspecção e a prática dessa, é uma condição basal para nossas investigações que tem como premissa o observador-participante. É importante entendermos que se trata aqui apenas de uma questão estritamente metodológica, da qual para funcionar dentro desses parâmetros não podemos abrir mão de alguns preceitos como foi explicado, assim como para as ciências naturais o fariam, caso tivessem que desconsiderar algum preceito metodológico que fosse fundamental as suas investigações.

O segundo ponto com relação aos cientistas não conseguirem reproduzir em outros laboratórios os resultados constatados por outros pesquisadores, reside no fato em que os praticantes testados vivenciem sugestivamente aquilo que os pesquisadores esperavam em suas pesquisas e não aquilo que verdadeiramente vivenciariam, caso não houvessem sugestões. É um dos problemas quando lidamos com a constatação de fatos advindos de experiências subjetivas que podem ser sugestionáveis ou influenciadas por alguma fonte externa. A título de exemplo, no livro: “A Ciência da Meditação” de Daniel Goleman e Richard J. Davidson, aonde em uma determinada ocasião, uma das pesquisas de Daniel Goleman havia sido citada por 313 artigos de periódicos que mencionavam os resultados de um de seus estudos sobre a prática da meditação, porém, nem um sequer deles tentou reproduzir o estudo para descobrir se obteriam dados semelhantes. Os autores simplesmente presumiam que os resultados eram sólidos e essa era já uma base suficiente para suas conclusões. Exemplos como esse não são casos isolados como diz Richard: “A reprodutibilidade, destaca-se como uma força do método científico; quaisquer outros cientistas deviam ser capazes de reproduzir um determinado experimento e publicar os mesmos resultados, ou revelar o fracasso em reproduzi-los. Mas pouquíssimos sequer tentam. Essa ausência de reprodução surge como um problema onipresente na ciência, em particular quando se trata de estudos sobre o comportamento humano. Das cem descobertas mais frequentemente citadas na psicologia, tentativas metódicas de reprodução foram verificadas em apenas 39% dos estudos originais. E apenas uma fração minúscula dos estudos em psicologia chega a ser considerada para reprodução; os incentivos da área favorecem o trabalho original, não a duplicação. Além do mais, a psicologia, como todas as ciências, tem um forte viés de publicação entranhado: os cientistas raramente tentam publicar estudos quando não obtém resultados significativos. E no entanto o próprio resultado nulo significa muita coisa”.

Outro aspecto que devemos levar em consideração em relação aos cientistas não conseguirem reproduzir em seus laboratórios os resultados conseguidos por outros pesquisadores é a diferença entre o que se chama de medições “sensíveis” e medições “rígidas”. Se em um experimento envolvendo os resultados da prática introspectiva aonde você pede a pessoa para relatar suas impressões subjetivas como: sensações, sentimentos, pensamentos, o comportamento por exemplo, você está lidando com as medições sensíveis, como dito por Richard J. Davidson: “fatores psicológicos como o humor do momento e querer passar uma boa impressão ou agradar o pesquisador podem influenciar enormemente o modo como reagem, por outro lado, tais vieses têm menor (ou nenhuma) probabilidade de influenciar processos fisiológicos como batimentos cardíacos ou atividade cerebral, o que faz deles mensurações rígidas”.

Muitas pesquisas em meditação ou se utilizando de práticas introspectivas, baseiam-se até certo ponto em medidas sensíveis aonde as pessoas que passam pelos experimentos avaliam as suas próprias experiências e as consequências desse. Quando nos utilizamos de avaliações subjetivas de ansiedade, prática comum entre as pessoas, terapeutas, médicos e psicólogos, pedimos as pessoas para avaliar a si próprias em opções como: estou muito ansioso, ou quase não estou ansioso, ou quase nunca estou ansioso, ou eu sempre estou ansioso! Esse tipo de método, quando perguntamos após as práticas meditativas ou introspectivas de uma maneira geral, comumente revelam que as pessoas sentem menos ansiosas, mais serenas, presentes, mais tranquilas e relaxadas após a primeira prática. É um tipo de constatação comum para nós que praticamos e lidamos com isso diariamente e nos estudos e métodos que colocam os marcadores sensíveis dentro de seus métodos de trabalho sobre a introspecção, mas como diz Davidson: “Tais estudos autor-relatados são notoriamente suscetíveis à “demanda de expectativa”, os sinais implícitos para informar um resultado positivo. Tais autor-relatos de melhor gerenciamento do estresse aparecem muito mais cedo nos dados dos meditadores do que medições rígidas como atividade cerebral. Isso pode significar que a sensação de ansiedade diminuída que os praticantes de meditação vivenciam ocorre antes de mudanças discerníveis nas medições rígidas – ou que a expectativa de tais efeitos enviesa o que os meditadores afirmam”.

Nesse sentido, o que realmente seriam promissores em pesquisas que utilizam-se da introspecção meditativa como constatação de mudanças discerníveis e através de medições rígidas para aferirmos mudanças verdadeiramente estruturais a nível de cérebro e no funcionamento das redes neurais, assim como outras mudanças fisiológicas contatadas em práticas de praticantes veteranos, é nos engajarmos em pesquisas de médio e longo prazo com esses praticantes assim como o professor Richard J. Davidson e seus colaboradores, realizam em seu laboratório. Porém, quero enfatizar aqui, que nesse aspecto, estamos falando desse viés das práticas introspectivas associada as pesquisas em neurociências que no caso, está inserida nas ciências naturais,  dais quais estão apresentando resultados estruturais-materiais (no cérebro) das potencialidades da prática meditativa para com o saúde e o bem estar humano a nível físico, psíquico e comportamental, mas ainda sim resta um grande espectro de investigações a serem realizadas, quando encaramos a introspecção como uma forma de investigação da natureza da mente explorando compreensões e matizes dessa que até então, ainda não foram contempladas pelas nossas psicologias e medicinas vigentes.

Se fossemos pensar enquanto uma abordagem epistémica própria para com o intuito de investigar a natureza da mente, a introspecção e tudo que se desdobra a partir da sua prática e de seus métodos, poderíamos dizer que estás, certamente são a abordagem dos Iogues em termos de visão e proposta epistemológica e que, em nosso caso, adotamos aqui seus métodos para empreitarmos a investigação sobre a natureza da mente segundo os seus achados e orientações, à medida que também vamos construindo uma base sólida para compreender os fenômenos que vivenciamos a partir de nossas próprias práticas de introspecção. Ao debatermos sobre a introspecção como forma epistémica de se fazer ciência, é importante ressaltar que não se trata aqui de simplesmente acreditarmos cegamente nas orientações dos Iogues, mas de entendermos a relevância da sua cultura, da suas práticas e dos achados que esses veem acumulando ao longo de milênios, e porque não, nos colocarmos abertos a investigar sobre do que se trata tais práticas e apontamentos filosófico-científicos dos quais eles tanto falam, mas que até algumas décadas atrás, não dávamos atenção por estarmos mergulhados em uma forma de visão no que diz respeito a se fazer ciência, aonde essa autocentrava-se em apenas determinados preceitos metodológicos inviabilizando um diálogo ou ponte entre as visões epistémicas ou conhecimentos científicos Iogues de fundamentada sistematização empírica vivencial, “até certo ponto”, de um empirismo baconiano com os conhecimentos científicos alicerçados nas ciências naturais e humanas como a conhecemos, com forte influência no pensamento cartesiano-materialista. 

Assim como Freud e Lacan, procuraram encontrar mecanismo para sondar as profundezas do inconsciente através da linguagem, os Iogues e Budistas o fizeram de maneira diferente, através do silêncio e até de certa forma, pela via de uma “não linguagem”, não mental, da não cognição (a não cognição aqui, não se refere a um cérebro totalmente inativo de um meditador enquanto medita, pois até onde sabemos, isso não acontece, mas sim, a não procura de nenhum tipo de elaboração mental enquanto se está meditando). Estamos falando de uma ciência contemplativa, que mergulha nas profundezas do cultivo do silêncio e lida com uma certa abertura ao encontro de “coisas” que não podem ser ditas, por serem inefáveis, inconcebíveis ao intelecto ou mesmo expressas através desse, mas que podem ser praticadas segundo os seus métodos. Esse é um dos campos de investigação dentro das ciências introspectivas.

Quando se fala sobre os quatro principais caminhos neurais na prática da meditação, no sentido da prática meditativa os influenciarem, como dito por Davidson: “o primeiro caminho neural que a meditação transforma, são os que reagem a eventos perturbadores, o estresse e a recuperação dele, o segundo sistema cerebral de compaixão e empatia, revela-se notavelmente pronto para um upgrade, o terceiro, é o circuito da atenção e que também melhora de inúmeras maneiras, isso não nos causa surpresa, haja vista que a meditação em sua essência treina nossos hábitos e foco e o quarto sistema neural de nosso senso de eu, recebe pouca atenção na conversa moderna sobre a meditação, embora tradicionalmente se constitua em uma das grandes metas para alteração. Quando esses fios de mudança se entrelaçam, há duas maneiras principais pelas quais a pessoa se beneficia do esforço contemplativo: ter corpo são e mente sã”. É justamente relacionado ao quarto sistema neural de nosso senso de eu que como supracitado, não é dada a devida importância nos estudos modernos sobre a meditação, mas que tradicionalmente são uma das principais ênfases, que entendo ser importante nesse caso, pesquisarmos a introspecção meditativa como forma epistémica de investigar a realidade da natureza da consciência humana. 

A partir dos problemas apontados, vemos que a uma diferença metodológica com relação à investigação da mente humana tendo a introspecção como ferramenta metodológica comparada as práticas espirituais de matriz oriental presentes nos Budismos e em variadas tradições Iogues Indus. O principal ponto e que considero o mais fundamental da diferença metodológica entre os cientistas que enveredaram-se em investigar a mente-consciência e seus fenômenos através da via introspectiva e os Iogues, é que os últimos foram instruídos e orientados por pessoas que profundamente dedicaram as suas vidas a prática da introspecção e a partir não só de suas instruções que poderíamos entender como “hipóteses” de investigação apreendidas através das falas de seus mestres assim como pelos apontamentos de práticas e fenomenologias que poderiam ser vivenciadas através das práticas citadas em textos tradicionais, esses Iogues então, transforam-se em seu próprio laboratório de práticas para observar se tais hipóteses eram verificáveis ou não e a título dos bons exemplos, no que tange aos verdadeiros e honestos praticantes, assim como o Buda histórico Shakyamuni, que  fizera esse tipo de empreitada com a devida e necessária agudez crítica para encarar estes ensinamentos não como uma verdade inquestionável, mas sim como uma base convidativa a experimentação em seu próprio laboratório de introspecção, dos quais a prática foi a própria base de averiguação se tais conhecimentos acerca da natureza da realidade humana eram de fato verdadeiros ou não.

Construindo então suas investigações a partir de suas próprias práticas e experimentações conforme às instruções de outros praticantes mais experientes, os Iogues foram construindo com solidez uma ciência totalmente baseada na constatação e experimentação empírica vivencial, ao meu ver, mais sólida em muitos casos como supracitado, aonde um grande percentual de pesquisadores, citam experimentos de outros como verdades, mas sem testar em seus próprios laboratórios. Na ciência introspectiva Iogue, esse tipo de ocorrência poderia acontecer em casos aonde o praticante estava nublado mais por interesses materiais do que pela real transformação espiritual, mas como é notado nessa forma de saber, aquele que verdadeiramente não alcançou tais acessos, está naturalmente impossibilitado de transmiti-los de maneira eficaz, e comumente isso é notável pelas suas ações e pelos seus alunos, mas aqueles que verdadeiramente alcançaram tais sabedorias, é notório a sua fluidez ao transmitir os próprios. Esse prerrogativa é bastante consistente em relação ao modo como os Iogues verdadeiramente realizados foram ensinando tais saberes acerca da natureza da mente e ao constatarem tais conhecimentos a partir de suas próprias práticas interiores, estas, foram a base para que transmitissem de geração em geração mantendo-os vivos até hoje como um método a ser praticado e testado experimentalmente através da meditação e não como uma crença dogmática inquestionável a ser seguida.

A primeira vista, as prática introspectivas e todo o seu empirismo vivencial, por mais técnicas ou específicas que sejam seus métodos, poderíamos mesmo assim pensar em uma série de questões sobre o fato desses Iogues, Budistas e até mesmo Cristãos primitivos a que tudo indica, praticavam métodos semelhantes as práticas espirituais dos Iogues Indianos e Budistas, não poderiam estar apenas reproduzindo práticas desprovidas de qualquer tipo de método considerado minimamente científico, não configurando-as a um patamar de uma possível abordagem epistémica, no que diz respeito a imprecisão de suas metodologias e concluirmos então, que na realidade não passam apenas de práticas ou repetições das expressões culturais-religiosas de seu povo!

Não é incomum ainda hoje, mesmo após as descobertas da neurociência contemplativa, que ao investigar vários métodos tradicionais de meditação dos quais foram encontradas enumeradas evidências dos seus impactos no que diz respeito à transformações a nível estrutural no cérebro e suas redes neurais, além de aspectos de ordem mais subjetiva como evidenciado pelo treinamento destas práticas introspectivas, que mesmo assim, as práticas introspectivas ainda são marginalizadas dos grandes debates acadêmicos, sendo alvo de descrédito por uma parte da comunidade científica presente ainda dentro da psicologia, da medicina e até mesmo das neurociências afirmando que tais práticas são desprovidas de metodologia consistente e não verdadeiramente eficiente enquanto um método-científico razoável, entendendo estas práticas como apenas uma forma de manifestação cultural da espiritualidade humana a título de uma forma de expressão social ou folclórica de um povo. Aprofundo essa questão em um artigo chamado: “Não é uma questão apenas, de aceitar a fé do outro!”

Pois bem, essa é com certeza uma das grandes dificuldades em se provar que as práticas introspectivas enquanto métodos de investigação da realidade, teria um caráter consistente e “seguro” até certo ponto, se comparados ao investigamos fenômenos mensuráveis ou de natureza exterior-palpável, como das ciências duras. Em certa medida as ciência humanas e não estritamente condicionadas aos paradigmas das ciências naturais, passam também por suas dificuldades, pela fato de em ambas (nas ciências humanas e da introspecção) lidarmos com paradigmas distintos às ciências naturais. Uma parte ao meu entender da resolução para contemplarmos esses conflitos é quando olhamos para a experiência empírica de seus praticantes e essas vão indo ao encontro de compreensões “universais” no sentido de já terem sido evidenciadas e catalogadas dentro da literatura específica no que tange a essas práticas, mesmo que em muitos casos (e isso não é incomum), os praticantes vivenciam coisas das quais não foram orientados ou induzidos a vivenciar mas que de alguma forma em suas experiências particulares relatam terem tido a vivência de uma certa fenomenologia que já era pré-existente na literatura e nos ensinamentos dos mestres, com relação a prática e aos métodos introspectivos que estavam praticando exemplo: na minha experiência como professor de yoga é rotina eu ter alunos que ao sentarem para meditar, relatarem ter sentido uma sensação energética de um calor subindo internamente pelo centro da sua coluna vertebral, aonde essa energia ia até um determinado ponto do corpo como o abdômen, o peito, a garganta, entre as sobrancelhas ou até mesmo no topo da cabeça, e então, constatarem por si mesmos, que até onde essa energia ou calor se direcionaram, ficando estáticas em um ponto específico parando então ali ou mesmo em alguns casos, que continuavam a subir se exteriorizando para fora a partir de um dos pontos citados e percebendo-se que em alguns casos, quando tal fenômeno ocorrera, notou-se que a respiração estava cessada ou parcialmente cessada, porém, fazendo com que a pessoa não sentisse nenhum tipo de desconforto e sim pelo contrário, sendo tomada de uma grande sensação de alegria, contentamento, felicidade, beatitude, graça entre muitos outros adjetivos ligados a essa experiência.

Fenomenologias específicas como essas e muitas outras, são relatadas por pessoas que praticam meditação (fora o que encontramos na literatura escrita como indícios fenomenológicos que podemos acessar ao aprofundarmos em nossas práticas), porém, o que torna isso ainda mais curioso e ao que chamei anteriormente de “experiências universais”, é o fato de que em muitos casos, os praticantes, não tinham nenhum tipo de conhecimento prévio que as induziam a vivenciar o que estavam sentindo. De acordo com alguns conhecimentos da Yoga, eles poderiam estar passando por algum nível de samadhi (silencio mental ou absorção cognitiva) aonde ao o prana (energia cósmica ou energia interna) se equalizar com o diminuir dos fluxos respiratórios entre inspiração e expiração, esse hiato entre um e outro, propiciaria um equilíbrio interno no qual um certo prana interno, pode sustentar energeticamente o corpo por um tempo, mesmo que esse fique sem respirar por alguns segundos ou até mesmo minutos e que consequentemente esse equilíbrio entre as polaridades laterais energéticas de ida e pingala nadis (meridianos sutis de energia) fariam com que um canal de energia sutil, localizado no centro e interior da coluna vertebral chamado de sushumna nadi, acordasse e despertasse essa energia pelo canal central sutil no interior da coluna, provocando a subida da energia chamada de kundalini o que comumente é entendido e traduzido fenomenologicamente como uma certa sensação física sutil de um calor prazeroso que sobe pelo interior da coluna.

Esse é um bom exemplo para o que chamei acima de “experiências universais” pelo fato das pessoas vivenciarem alguns fenômenos internos sem terem sido informadas sobre a sua existência, porém, a partir de seu laboratório de práticas meditativas, constataram por si mesmas o que é relatado pelos Iogues ou praticantes veteranos, assim como pelos textos tradicionais que explicam os métodos meditativos e alguns fenômenos que os perpassam quando nos colocamos a praticá-los.

Agora, imagine que todos esses fenômenos vivenciados internamente pelo praticante possam no máximo demonstrar externamente através de instrumentos de medição que ocorrerá a diminuição das frequências cerebrais de beta para alfa, assim como a diminuição da frequência cardíaca, à ativação ou não de determinadas áreas neurais, assim como a constatação que determinadas áreas do cérebro foram estimuladas ou não. Bem, podemos entender que essas constatações físicas e neurais são capazes de traduzir tudo aquilo que esse sujeito vivenciou em seu laboratório de práticas introspectivas? Se a resposta a essa pergunta for um sim, sou obrigado a dizer que além de ser uma resposta reducionista da própria experiência humana, essa resposta reduz a própria experiência subjetiva do sujeito em mensurações ou medições de escalas, restringindo a experiência vivenciada empiricamente ao que é possível de ser captado por um instrumento tecnológico com as quais até o momento a gente conseguiu aferir sobre a realidade a nossa volta, mas que em hipótese alguma, poderíamos entender como uma realidade que encerra às possibilidades de traduzir as experiências internas do humano com respostas externas captadas pelas máquinas.

Gosto sempre de lembrar que até bem pouco tempo, não conhecíamos a corrente elétrica e tão pouco conhecemos o eletromagnetismo nos tempos de hoje, ou seja, se pensarmos nas implicações do que está por vir não só com os avanços das ciências naturais, mas também nas distintas epistemologias científicas que estão construindo pontes de interface entre a consciência e o mundo físico-objetivo, teremos nas próximas décadas novas abordagens e modelos teóricos cada vez mais robustos, para podermos contemplar o quanto é ampla a investigação que está envolvida a pesquisa da consciência-mente por detrás das experiências subjetivas vivenciadas pelo ser humano. No livro: “Dimensões Ocultas: A unificação de física e consciência”, Wallace, escreve um capítulo intitulado: “Uma teoria especial da relatividade ontológica”, aonde nesse capítulo, ele apresenta vários modelos teóricos sobre o entendimento do mundo objetivo ou a ideia de matéria propriamente dita, e o que seria o mundo subjacente, unitivo (um domínio anterior ao mundo físico-objetivo) apresentando as visões de mundo desde os clássicos como Demócrito, Pitágoras, Platão e Spinoza até às contribuições de físicos, psicólogos e filósofos modernos e contemporâneos como Wolfang Pauli, Carl Jung, David Bohm, Gerard´t Hooft, Leonard Susskind, George Ellis e Roger Penrose (aprofundarei sobre esses novos modelos teóricos no próximo capítulo).

 Além de reducionista, quando damos uma afirmativa dizendo que os instrumentos de medição, são os únicos marcadores confiáveis para aferirmos o que é um fato científico ou não, entendo que além de intelectualmente desonesto, nesse caso, temos aqui a legitimação de um princípio hegemônico de se colocar a visão epistémica das ciências naturais sobre as demais possibilidades epistémicas, como no caso, de bases epistémicas humanas-fenomenológicas, que levam em consideração, outros elementos, para se investigar a realidade ou até mesmo a natureza da mente. Não pensar que existe mais coisas por detrás dessas experiências vivenciadas e metodologicamente registradas em variadas práticas introspectivas orientais que nos apontam conhecimentos e sabedorias a serem desveladas através das nossas práticas introspectivas, é no mínimo uma atitude negligente em relação a outros olhares possíveis para se investigar determinados fenômenos, como no caso, das manifestações da mente.

Aspiro que encontremos da forma mais esclarecida e reproduzível possível, as pistas para entendermos os métodos científicos e como esses chegam até os seus resultados, porém, é importante que tenhamos uma maior abertura para contemplarmos que algumas formas epistémicas de investigar a realidade de determinados objetos, como no caso da mente, são insuficientes, quando a única via epistémica que se usa para tal investigação são as das ciências naturais. A investigação do “objeto” consciência-mente, não acredito que será devidamente compreendida e explorada em seu amplo espectro de possibilidades de análise, se nos utilizarmos apenas das teorias comportamentais, psicanalíticas, cognitivas, biomédicas, das neurociências, ou das áreas humanas, fenomenológicas, existenciais, ou de qualquer proposta que olhe para a subjetividade humana apenas dentro dos limites do exercício intelectual, precisamos também acrescentar a investigação das interfaces entre física e consciência através da mecânica quântica aliadas à introspecção meditativa como parte desse espectro ferramental de abordagens possíveis para se investigar a consciência-mente.

Na matéria médica da medicina tradicional chinesa, essa ao longo dos seus mais de 5 mil anos de práticas e experiências clínicas através do uso das plantas medicinais, compilou uma imensa farmacopeia quanto ao uso dessas plantas através da prática empírica, das quais se constatou ao longo do tempo e uso destas plantas os seus benefícios, porém, mesmo que muitos dos seus mecanismos de funcionamento não são possíveis de serem explicados pela via do raciocínio físico-químico, isso não é uma garantia que aquele saber deveria ser relegado ao desuso por não sabermos explica-lo uma vez que esse apresenta resultados clínicos “misteriosos” que talvez atuem em vias que a nossa epistemologia médica não consegue explicar por suas bases paradigmáticas, mas porém, quando nos utilizamos de outras racionalidades como por exemplo a da teoria dos “Jing-luo” ou o que chamamos de meridianos e colaterais, aonde se entende o mapa ou a “geografia energética” do corpo físico como um todo, passamos a entender por outra racionalidade epistémica médica, o porque de determinada planta, ou mesmo do uso da manipulação em determinadas partes do corpo, seja com o uso da acupuntura ou da massagem (Shiatsu e Tuina), podem funcionar, mesmo que por uma via biomédica não faria sentido algum tal intervenção. Gosto de dar esse exemplo, para contemplarmos que quando acrescentamos outros saberes, podemos enxergar outras vias para investigar o nosso objeto de pesquisa, e no caso da introspecção, essa nos traz outras vias para investigarmos a natureza da mente que até então, não foram exploradas pelas nossas psicologias e pela própria medicina moderna.

@professormichelalves

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