B. Alan Wallace em seu
livro, Mente em equilíbrio diz que: “William
James (1842 – 1910), o grande pioneiro americano da psicologia, sentiu que a
compreensão científica da mente em seu tempo estava praticamente tão pouco
desenvolvida quanto a física antes de Galileu. Desde 1600, ele observou, os
cientistas tinham concebido métodos para investigar o mundo externo que podiam
ser submetidos à análise matemática. Desse modo, questões há muito discutidas
por filósofos foram finalmente resolvidas pelos métodos empíricos da ciência.
Quanto mais a ciência progredia, menor o número de problemas nas mãos dos
filósofos. William James definiu a psicologia como “a Ciência da Vida Mental,
tanto de seus fenômenos quanto de suas condições. Os fenômenos são as coisas
que chamamos de sensações, desejos, cognições, raciocínios, decisões e assim
por diante”. Enquanto os físicos estudavam coisas físicas que eram acessíveis a
todos os observadores competentes, os psicólogos deviam examinar processos
mentais subjetivamente experimentados e as relações deles com seus objetivos,
com o cérebro e com o resto do mundo. Mas as experiências mentais são coisas
particulares e inacessíveis à observação direta pelas ferramentas da ciência.
Então James propôs que a psicologia deveria usar fundamentalmente a
introspecção para estudar os processos mentais. Contudo, a observação direta
dos estados e processos mentais da pessoa, ele argumentou, deve ser completada
pela pesquisa comparativa, como o estudo do comportamento animal e a ciência
experimental do cérebro. Enquanto James se concentrava na observação
introspectiva da experiência mental consciente, o neurologista austríaco
Sigmund Freud (1856 – 1939) ficou bem conhecido pelas teorias sobre a mente
inconsciente. Seu trabalho foi pioneiro no qual o terapeuta procura descobrir conexões
entre os comportamentos inconscientes dos processos mentais dos pacientes com
base em seus relatos verbais feitos pelos pacientes de suas experiências
subjetivas no estado desperto e no sonho, Freud procurou sondar os mecanismos
ocultos da mente”.
Talvez
esse tenha sido o momento de nossa história que poderíamos também ter escolhido
a pesquisa sobre a introspecção como mais uma possibilidade de investigação
científica, mas que infelizmente não foi um caminho tomado pelas epistemologias
ocidentais dominantes. Fico sempre pensando nesse ponto de nossa história
aonde, assim como de muitas outras, desde os processos de colonização aonde os
europeus munidos de suas verdades e inflamados em catequizar os ditos “povos
primitivos” com as suas visões de mundo, forçavam esses povos através da
propagação de suas ideológicas, fazendo-os pensar sobre os seus ângulos de
visão e consequentemente eliminando toda uma diversidade de saberes e culturas,
conforme iam homogeneizando os povos conquistados com os seus conhecimentos
ditos “superiores”. As colonizações não eram apenas colonizações territoriais,
mas também, colonizações culturais, colonizações de visões de mundo, aonde
reduz-se a diversidade contida na visão dos outros à custo de uma visão que se
julgue ser a melhor, mantendo essa última viva a custo que outras morram, para
que então se torne hegemônica.
Nesse
aspecto, transpondo para o nosso contexto de mundo ocidental científico
materialista do homem positivista, exceto em casos de evidente refutação a
olhares e perspectivas distorcidas sobre a realidade que foram categoricamente
refutadas através de fatos científicos, nem sempre como até os dias de hoje a
ética e o interesse genuíno pela verdade, são o terreno básico de fundo que
alicerça e ampara os bastidores das comunidades científicas, aonde em muitas
situações, o que vemos não é o interesse genuíno pelo saber e pela verdade, mas
sim, a manutenção de uma estrutura institucional aonde a narrativa “científica”
é usada mais como moeda de poder para manter essas estruturas e seus recursos,
do que outra coisa, como dito por Pierre Bourdieu em seu livro: “Os usos sociais da ciência, por uma
sociologia clínica do campo científico” ele apresenta diferenças
claras entre os cientistas ocupados com
a verdade científica e os cientistas ocupados com o capital por de trás das
instituições científicas, aonde essas ocupações se voltam a questões
ideológicas das quais manterá suas estruturas de poder e não pela investigação
da verdade dos fatos científicos em si.
De
alguma forma, no amplo espectro das possibilidades do campo científico para a
investigação da mente-consciência ou a psique, os protagonistas eleitos como
peças em um tabuleiro de xadrez para investigar a história da mente no ocidente
foram o comportamento que no Behaviorismo radical nega até mesmo a completa e
total existência de uma mente, o inconsciente, a área da
fenomenologia-existencial-humanista que gravita naquilo que tange ao espectro
do que é consciente, a cognição amparada pelos estudos do cérebro através das
neurociências, mas a introspecção foi deixada de fora, a margem desse “campo
eletromagnético de epistemologias possíveis”! Qual o motivo ela não encontra-se
nesse debate? Só em meados da segunda metade do século XX começamos a chamar
essa última para um conversa franca e honesta acadêmica e intelectualmente
falando. Para nossa sorte, por outro lado, a introspecção nunca foi deixada de
lado pelos “cientistas espiritualistas Iogues” de matriz oriental e até mesmo
ocidental com alguns focos isolados dentro do cristianismo.
Enquanto
seguíamos sistematicamente medindo e controlando tudo que diz respeito a
matéria e mesmo quando resolvíamos investigar o subjetivo através das ciências
humanas, o fazíamos com uma certa timidez e cuidado para não flertar com tudo
aquilo que parecesse soar da ordem do não físico ou mais próximo do espiritual,
aonde tentávamos ajustar a “mente-consciência” humana através dos estudos do
comportamento e do inconsciente com um certo receio e cuidado para que se
parecesse congruente com as ciências positivistas naturais, mesmo como no caso
da Psicanálise que não o é, nesse sentido, entendo que fizemos um mergulho,
porém, um mergulho tímido e não tão desbravado quanto a perspectiva
introspectiva dos Iogues, pois esses sabendo do que sabem pelos seus
laboratórios vivos de práticas, não foram convencidos que a sua ciência era
retrógrada e primitiva, e diante disso, não deixaram de seguir praticando e
fazendo as suas auto-investigações sem receios e rodeios no que tange as
origens e causas do espírito e da consciência como um todo.
Porém,
mesmo diante dessa nova abertura a introspecção, não sejamos inocentes e
ingênuos, pois essa ainda é bastante mal compreendida por boa parte da
comunidade científica e ainda sim, é vista como algo retrógrado e superado
quando na realidade, ainda nem se quer, foi devidamente investigada pela a
maioria de nós. William James, assim como muitos outros, acredito terem tido
momentos conflitivos, por enxergarem um via epistémica “nova de certa forma”,
fértil e possível de investigações científicas, mas que infelizmente, por
desprezo, não valorização e principalmente incompreensão por parte da
comunidade científica a sua volta, não enxergaram as possibilidades, “ o ouro”
a potência que a introspecção abria como mais um dos elementos gravitando o
campo da investigação de uma ciência esclarecida e destemida de ir ao encontro
aos fatos científicos por caminhos ainda não testados. As vezes penso que o
terreno talvez não estivesse realmente fértil para germinar a introspecção como
forma epistémica de investigar a natureza da mente, mas nos tempos de hoje, não
só pelas descobertas através da neurociência contemplativa que está alicerçada
pelas ciências naturais, mas também em nossos tempos, esse terreno encontra-se
mais que adubado para refletirmos sobre a investigação da mente ao viés de
epistemologias humanas e não estritamente materialistas, como as descobertas
que venhamos realizando através da mecânica quântica.
@professormichelalves
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