quarta-feira, 26 de julho de 2023

A negação da realidade mental: estamos cometendo um atentado contra a própria vida e não só a vida humana, mas a vida de todos os seres?


 

Alan Wallace em seu livro, Mente em Equilíbrio diz: “Com a rejeição do uso científico da introspecção, a psicologia acadêmica no mundo de língua inglesa deslocou-se para o behaviorismo, que fez tudo que podia para eliminar referências a estados e processos subjetivamente experimentados. John B. Watson (1878 – 1958), um dos pioneiros do behaviorismo americano, declarou que a psicologia não devia ser mais a ciência da vida mental, como William James a tinha definido. Como “um ramo experimental puramente objetivo da ciência natural”, dizia ele, a psicologia “jamais deveria usar os termos consciência, estados mentais, mente, essência, introspectivamente verificável, imaginário e assim por diante”. Este tabu contra e experiência subjetiva foi motivado, em parte, pela associação da mente (ou alma) com religião e, em parte, pela natureza aparentemente não física dos eventos mentais. A desconfiança dos cientistas diante de qualquer coisa religiosa é bastante compreensível, pois para eles a religião exige uma crença inquestionável na autoridade. A ciência, pelo contrário, coloca sua prioridade básica no conhecimento experimental. Eis o atrito. Pois a evidência experimental, para ser encarada como evidência empírica, tinha de ser verificável, acessível a inúmeros observadores competentes. Mas os processos mentais só podem ser observados internamente. Não podem ser detectados por nenhum observador externo ou por nenhum dos instrumentos da ciência, que são concebidos para medir todos os tipos conhecidos de realidades físicas. Consequentemente, os psicólogos se encontraram num dilema: deviam perseverar no espírito do empirismo, que estivera na raiz do progresso científico nos últimos trezentos anos? Ou deviam se colar à observação de objetos físicos, externos, o domínio da realidade onde a ciência desfrutara tanto progresso desde a época de Galileu? Optaram pelo segundo foco, mas estreito. Os behavioristas preferiram estudar o comportamento humano e não quaisquer misteriosas entidades interiores, espirituais, mentais, que não pareciam ter propriedades físicas próprias. O behaviorismo, pelo menos como foi desenvolvido na psicologia da pesquisa acadêmica, preocupava-se basicamente em encontrar meios eficientes de compreender a mente humana por meio do comportamento, em vez de inferir conclusões sobre a natureza real dos processos mentais. Era como tentar compreender a anatomia e a fisiologia humanas sem jamais executar autópsias – que eram proibidas na medicina medieval. A maioria dos behavioristas tinha bastante consciência dos estados mentais, mas achava que a psicologia se desenvolveria mais depressa e com menos digressões se deixasse a introspecção de lado por algum tempo. Contudo, behavioristas mais radicais, começando com Watson, deram um passo adicional ao declarar que os processos mentais, em geral, e a consciência, em particular, não existiam absolutamente – simplesmente porque não tinham propriedades físicas! Era um caso nítido de rejeição, em que um compromisso ideológico com o materialismo invalidava a evidência experimental que não tivesse de acordo com uma crença. Pior ainda, os behavioristas identificavam o comportamento com os próprios processos psicológicos. Os robôs exibem um comportamento, mas não estão conscientes e não têm experiências subjetivas. Os homens também exibem um comportamento; por mais escrupulosa, no entanto, que seja sua avaliação, o comportamento físico por si mesmo não fornece evidência sequer da existência das realidades mentais que todos nós vivenciamos. A afirmação de que a experiência subjetiva pode ser reduzida a um comportamento objetivo não passa de desonestidade intelectual ou de profunda confusão”.

Quando vemos essa forma de reducionismo por parte dos Behavioristas, aonde restringem as experiências internas e subjetivas humanas a comportamentos condicionados consequentes aos estímulos ambientais, é o mesmo que entendermos que somos máquinas que recebem e operam através de estímulos ou inputs-ambientais, dos quais nosso software (nossos estímulos sensoriais ao ambiente) é o que programa os nossos comportamentos e o nosso hardware (a nossa maquinaria biológica) preparada materialmente para receber a realidade ambiental, sendo essas instâncias a única forma de contato com os fenômenos da realidade que nos cerca e da qual estamos limitados a viver através dos estímulos ambientais que recebemos.

A mente, a psique e a vida sendo enxergada por esse prisma, é a completa negação de toda forma de subjetividade ou vida interna que se processa dentro dos seres humanos. Não há nada de errado do ponto de vista científico-metodológico, investigarmos os fenômenos da realidade a partir de uma determinada base epistémica para então, a partir dessa, encontrarmos relações causais através do mapeamento de estímulos ambientais provocadores de respostas sensoriais ou comportamentais, assim como também, não há nada de errado na investigação científica praticada pelas neurociências, quando essas buscam compreender qual o caminho neural é ativado quando somos estimulados por fatores internos como: emoções, estados de humor, pensamentos e etc; porém, quando compreendemos que o própria explicação de um comportamento entendendo a sua mecânica, assim como compreender os estímulos cerebrais que dão nascimento a determinados sentimentos e emoções e a partir disso, afirmar-se que tudo que está ligada ao espectro do comportamento, nasce e morre do próprio comportamento, não existindo uma vida interna que pulsa e que é anterior aos estímulos geradores de ações comportamentais, assim, como entender que determinados circuitos neurais desencadeadores de emoções e estados de humor específicos é a explicação causal da origem do ente pensante, vivente, inteligente; é o mesmo que acreditarmos que todo os fenômenos que tangem ao que chamamos de mente-consciência, como os pensamentos, o próprio uso da imaginação, só existe enquanto fenômenos reais em decorrência destes nexos-causais restritos aos comportamentos ou aos movimentos neurais.

Pensar dessa maneira é uma forma tão limitada e higienizadora de enxergar a vida, que todo esse terreno básico e natural que é estarmos vivos dentro dessa experiência fantástica que é poder pensar e imaginar livremente com a nossa mente-consciência, a partir dessas denominações da mente como algo estritamente fechada ao campo biológico-comportamental, nós reduzimos essa experiência natural e espontânea a qual permeia todos nós enquanto seres sencientes, em meros constructos explicativos aonde as movimentações de elementos químico-biológicos que circundam pelo nosso cérebro e os nossos comportamentos no caso para os behavioristas, tornam-se a explicação objetiva do que é a vida e principalmente a vida inteligente-pensante. Estamos aqui, ao meu entender, cometendo um atentado contra a própria vida e não só a vida humana, mas a vida de todos os seres. Nessa perspectiva materialista da vida, estamos acreditando que o sentir e o emocionar-se humano, são apenas um emaranhado movimento de correlações neurais químico-biológicas de determinadas partes funcionais do nosso cérebro, assim como é reduzida toda a subjetividade humana e o que significa ser e estar humano em suas questões internas, existenciais, anseios, sonhos e ideias, há apenas explicações comportamentais.

A perspectiva materialista adotada da vida pelos behavioristas e pelos neurocientistas ortodoxos, parte da ideia de causação ascendente, aonde a vida mental (além de não existir para no caso dos Behavioristas), para os que aceitam a sua existência, essa é um subproduto da vida material, ou seja, são os elementos físico-químicos é que geram a vida mental como a conhecemos. Na perspectiva da causação descendente (poder causal da consciência sobre a matéria e não o contrário), essa defendida pelos visões epistémicas espirituais como no caso dos Budismos e de boa parte das distintas tradições Iogues Indianas e também por parte de uma comunidade científica heterodoxa dentro da mecânica quântica, a mente-consciência é que impera sobre as realidade materiais (físico-biológico-química), nesse sentido, entende-se que por detrás das aparências materiais que observamos, existe um inteligência pensante preexistente a ela.

@professormichelalves

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