Alan
Wallace diz:
Os
psicólogos continuam a estudar a mente indiretamente, questionando pessoas
conscientes e observando seu comportamento. Desse modo, investigam diretamente
os efeitos físicos de processos mentais. E os neurocientistas estudam a mente
indiretamente, explorando as bases neurais da experiência subjetiva. Dessa
maneira, investigam diretamente os correlatos físicos de eventos mentais, que
podem ser causas ou efeitos. As disciplinas combinadas da psicologia e da
neurociência são agora conhecidas como ciência cognitiva. Se os pesquisadores
deste campo limitassem suas pesquisas ao estudo do comportamento e do cérebro,
não teriam sequer ideia da existência da experiência subjetiva. O único meio de
os experimentadores poderem ter certeza de que existem estados mentais é
experimenta-los em si mesmos. Isso prova o valor da insistência de William
James de que a introspecção seja plenamente incorporada ao estudo científico da
mente”.
Novamente
aqui, reforçamos a ideia de que o único meio de termos certeza de que existem
distintos estados mentais é experimentando-os na primeira pessoa através da
introspecção. Estamos chegando ao meu entender, em uma encruzilhada no sentido,
de quais caminhos trilharemos com as ciências que se propõem a investigar a
natureza da mente. Um caminho já conhecemos, esse no qual a mente e seus
estados, são compreendidos de um ponto de vista biológico-neural e detectável
por instrumentos de medição ou interpretando os fenômenos mentais subjetivos
através da análise do comportamento reduzindo-os a esse, em outras palavras, é
como se a mente não existisse e os comportamentos fossem a evidência da sua não
existência, não aceitando a possibilidade do contrário, aonde os comportamentos
são meros reflexos da expressão da mente, assim como as imagens refletidas na
superfície d´água é uma expressão da própria água.
O
que não temos como afirmar, é se a mente e suas fenomenologias são de fato
provenientes de uma base neural e comportamental! Esse é um caminho científico
em curso e conhecido por nós e que do ponto de vista cognitivo, tem os seus
benefícios, porém, não encerra a questão do que de fato é a mente em seu
sentido fundamental. Pois explicando aspectos biológicos-neurais e
comportamentais acerca da mente, até então, continuamos a não encontrar as suas
causas, as suas propriedades elementares, e os nexos-causais dos quais explicam
a sua origem!
Investigando
a natureza da mente pela perspectiva introspectiva, podemos entender que a
maior parte das pessoas, salvo algumas exceções com relação a pacientes
psicóticos os pré-psicóticos, aonde nestes casos, a meditação não é em total
desencorajada, porém, deve-se ter alguns cuidados específicos devido à grande
fragilidade da estrutura de ego desses pacientes, as pessoas em geral com
adequada orientação de um mestre ou legítimo professor, pode vir a apreender
através de seu próprio laboratório de práticas pessoais, variadas teorias e
técnicas meditativas a partir de métodos testados que já foram colocados
empiricamente a prova de fogo por centenas de anos por seus praticantes segundo
as literaturas Indus e Budistas, como é o caso das práticas de Shamata e de
Vipassana supracitadas.
O
praticante de introspecção meditativa ao longo dos anos, empreenderá uma longa
jornada de pesquisas sobre a natureza da própria mente contemplando em primeira
pessoa, pois a mente enquanto um fenômeno, sabemos ser uma fonte manifesta
permanente e inesgotável de estímulos, pois assim a percebemos operando noite e
dia em nossas vidas. Além de muitas técnicas aonde se busca estabilizar a
própria natureza incessante dos fluxos mentais, como é o caso das práticas de
Shamatas. Existem também, as práticas onde o meditante irá investigar os próprios
fenômenos mentais compreendendo como ele internamente se relaciona com tais
fenômenos e mesmo as investigações mais profundas sobre as origens dos
fenômenos mentais que emergem na superfície da consciência, investigando
minuciosamente a sua natureza, como é prescrito nas práticas meditativas de
Vipassana, Prajana-paramita, Maha-mudra e do Dzochen.
Utilizarmos
a introspecção-meditativa como uma outra alternativa, pensando a nível de um
honesto e razoável exercício intelectual, nada mais é do que praticar um
distinto caminho epistemológico como forma de investigação da mente humana, não
é mesmo? Não, anulando obviamente o caminho tomado pelas ciências cognitivas,
devido as suas evidentes contribuições que vem sendo adquiridas se mostrando
enquanto um sólido paradigma na condição de ciência comum (KUHN, 1950) e nessa
condição acumulando muitas descobertas; mas por qual motivo deixaríamos de
enveredar pela introspecção-meditativa enquanto uma outra alternativa
epistemológica?
Que
o óbvio seja dito, mas nada nos impede de tomar uma segunda via, pelo
contrário, é uma promissora abordagem epistémica para a investigação da mente
humana, que em detrimento das centenas de anos acumulados por distintos métodos
e textos a respeito das práticas introspectivas de meditação, fazem desses um
grande campo a ser investigado tanto do ponto de vista teórico quanto de suas
implicações práticas se pensarmos em desdobramentos científicos, psicológicos,
sociais, educacionais e na saúde.
Tendo a introspecção enquanto um instrumento a
fazer com que o sujeito se enverede pela prática, sendo essa uma alternativa da
qual ele possa compreender profundamente a sua própria mente, pensando essa
enquanto um ente tão íntimo e óbvio do ponto de vista existencial por convivemos
com essa incessantemente, porque deixaríamos de enveredar por um caminho tão
promissor e com tantos acúmulos de informações que hoje, felizmente temos
acesso?
Ao
meu entender, seria novamente um grande desperdício a nível de pesquisa
científica e para a humanidade como um todo, continuarmos a dar voltas ou
passos tímidos em direção a uma investigação mais objetiva e direta com relação
a natureza da mente humana e não adotarmos a introspecção meditativa enquanto
uma outra abordagem epistémica para tal fim. Perpetuarmos à investigação da
natureza da mente, só a partir de paradigmas materialistas que entendam o
cérebro e seu funcionamento neural como progenitor das fenomenologias mentais,
mesmo não as comprovando, como é o caso dos pensamentos, imaginação, emoções,
entre outros, ou das pesquisas ligadas à análise do comportamento que
negligenciam a possibilidade da existência da mente, enquanto um ente real ou
anterior a própria manifestação dos comportamentos, nada mais é ao meu
entender, que uma condição de cristalização de um determinado paradigma, não
permitindo que o mesmo sofra revoluções das quais poderiam romper suas
premissas e como consequência reconfigurar uma nova condição de ciência comum
(KUHN, 1950).
É
importante frisar, que o verdadeiro espírito científico não deveria estar a
serviço da hegemonia e institucionalização de um determinado saber mediante
convicções pessoais, ideológicas ou interesses particulares de determinados
grupos e instituições, e sim, se comprometer com a verdade das evidências e dos
fatos dos quais nos deparamos ao longo de nossos investigações, mesmo que essas
venham a ruir tudo aquilo que entendíamos ou que de alguma forma poderia nos
comprometer a nível particular, como por exemplo, não fazer mais sentido
persistir em algo do qual nos devotamos toda a nossa vida, mas que em
determinado momento, cheguemos à conclusão que tal empreendimento não merece
mais os nossos esforços devido as evidências que nos são apresentadas.
@professormichelalves
Nenhum comentário:
Postar um comentário