segunda-feira, 22 de abril de 2024

Que tenhamos a capacidade dos olhares incolonizáveis


 Que tenhamos a capacidade dos olhares incolonizáveis

Hoje, talvez seja estranho conjecturar que poderia existir uma maneira de colonizarem os nossos olhares, mas se pensarmos historicamente, às formas que fomos e estamos sendo colonizados nos últimos quatros séculos, em uma velocidade, agressiva e em “progresso”, sem precedentes, concluímos que não a nada de absurdo afirmar isso!

Apenas para lembrarmos: colonizaram a terra, colonizaram a água (há relatos de indígenas que achavam estranhíssimo, não tomarmos água direto dos rios e ao invés disso colocá-las em garrafas), já houveram tentativas na américa do sul de se apropriar através de patentes da água da chuva (isso aconteceu há algumas décadas), está em curso atualmente na china, a venda de oxigênio em balões (assim, como compramos hoje como algo trivial, água engarrafada) devido à alta taxa de poluição nas grandes metrópoles chinesas, como em Bejing, onde não se vê mais céu estrelado durante a noite e mal  o sol durante o dia, entre outras e inúmeras colonizações das quais não temos mais acesso de forma natural (gratuita) como deveria ser.

Para nós do sul global, pode parecer estranho, comprar oxigênio em balões para eu dar uma respiradinha de leve e mais saudável, mas não se trata aqui, de algo muito diferente que ter que comprar água engarrafada, e não sendo pessimista, mas se não cuidarmos, talvez, seja uma realidade nas próximas décadas para nós também.

Porém, de todas às colonizações, a que talvez mais tenha me chamado atenção, é a colonização do nosso tempo e essa sim, têm relação com a colonização dos nossos olhares, pois, quanto mais a minha experiência de vida, de existência é metrificada, roubada, pelo mundo da cobrança e do desempenho sem fins, menos tempo, eu terei de poder contemplar qualquer coisa!

A colonização do tempo que está em curso na contemporaneidade, não só termina de chancelar a morte de toda a capacidade contemplativa inerente aos humanos, mas também criam mecanismos muito sofisticados como estamos assistindo com às metrificações algorítmicas e às chamadas “inteligências” artificias (que convenhamos, que de inteligente, elas não têm nada né), porém, se tornaram sofisticadas ferramentas da pesca de nossas atenções, ou seja, adentramos na era da pescaria do tempo e nesse momento, somos peixes pescados por grandes empresas do times is money.

Assim, como todos os elos que temos com a natureza já foram colonizados, segue em curso a colonização do restante do que sobra. E o que é a sobra? Vou listar apenas algumas: seus olhares, suas ideias, seu tempo, nossas subjetividades, nossos corpos, nossa mente, nosso espírito, em fim, acho que não resta mais nada né! Estes também, já são como sempre foi, “objetos” a serem colonizados. A prova viva disso, é você entender que às empresas que mais crescem e têm riquezas no mundo atual (Google, Facebook, instagram, twiter entre outras), são às empresas que que têm à capacidade de capturar o tempo das pessoas, ou seja, são as empresas que têm como commodities à apreensão do tempo das pessoas, nesse sentido, o tempo, é nesse momento histórico o bem “material” mais caro do qual se comercializa.  

Gosto sempre de lembrar de uma passagem Budista Tibetana, onde Naropa, mestre de Marpa, pede a Marpa todo o seu ouro acumulado em troca de ensinamentos, por entender que seu discípulo estava apegado ao bem, e ao recebê-lo em mãos, Naropa joga-o no rio e diz: “Para que eu quero ouro, se tudo para mim é ouro”. Porém, é bom lembrar que isso aconteceu no século XIII (na idade média) e ainda no Tibet, no entanto, mesmo que em não temos o “privilégio” de estarmos em um mundo tão menos descolonizado que o de Naropa e Marpa (isso foi antes das primeiras e grandes revoluções industriais), guardo uma lição, para pensar que embora estejamos sistematicamente colonizados como somos nesse momento sem qualquer comparação à algum precedente histórico, ainda sim, existe à nossa capacidade de contemplarmos o mundo, mesmo que não tenhamos papéis em nosso nome, ou seja, se a minha contemplação ainda alcança a capacidade de SENTIR êxtase e embelezar-me com aquilo que se contempla, posso ser “dono do mundo” mesmo que nada seja objetivamente meu. Afinal, até nossos corpos são perecíveis né, sempre bom lembrar disso!

Eu então, apenas olho, desfruto e sorrio para as infinitas maravilhas.

*As fotos, são apenas uma sugestão, para te lembrar que você pode ser dono do mundo, desde que que seja capaz de contemplar a sua infinita beleza.


                                                                                                                        @professormichelalves

Que tenhamos a capacidade dos olhares incolonizáveis

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